Episódio 2 - O Jantar Romântico
:: O Taxi
Tudo bem, eu gosto muito de
filmes, mas isso faz de mim um roteirista? Bem... Quando estou escrevendo meu
livro, imagino a cena antes de transformá-la em letrinhas. Mas que ideia maluca
essa da Carol! Me enfiar de volta em uma faculdade! Já não basta escrever
resenhas, crônicas, contos, poesias, receitas e um livro? Por outro lado Carol
não vai me perdoar se eu não for! – “Anda
Ricardo, levanta logo esse braço e faz sinal pro táxi ou vai chegar atrasado ao
primeiro dia de aula!”
:: A PUC
Sensação estranha ao caminhar naquele
pilotis, subir aquelas escadas e caminhar pelos corredores até a sala de aula.
– “Pronto! Sala 117K, agora é só entrar e
ver o que acontece!”
Sabe àquela hora em que todo mundo fala um pouco de si, no que trabalha, suas
experiências profissionais? Pois então, chegou a hora! Um a um, os dezesseis
alunos foram se apresentando e falando um pouco de si como em uma chamada
escolar. Minha agonia aumentava a cada nova letra do alfabeto, até chegar à
letra “j”. José Mariano, estudante de economia, cinéfilo, largou tudo pra
escrever roteiros. Enfim o alívio! Eu não era o único estranho no ninho!
Tenho por hábito escrever o nome
de cada pessoa na primeira página do caderno. Anoto suas características
físicas, profissão e um comentário - estilo fofoca - na tentativa de adivinhar
o “tipo” de cada um. Exemplo: “Ella, jornalista, trabalhou com escritores
famosos, cabelos castanhos. Chapinha é sua melhor amiga! Elegante e simpática.
Vai dar samba, mulher interessante! Hum!”.
Sentou-se ao meu lado, com o frescor
de quem acabara de sair do banho. A temida letra “r” chegou! – “Profissão: curioso, blogueiro e escritor.”
Agora era esperar no dia seguinte os comentários, reparei que muitos anotaram o
endereço do blog.
:: O Convite
A próxima aula não seria nada
fácil, pois falar em público nunca foi meu forte. Teríamos que apresentar nosso tema, fazer um
resumo da história do nosso roteiro para o filme ante os ouvidos atentos e
afiados dos alunos e ainda com permissão para comentários e críticas! A história
não seria o problema, afinal era sobre o livro que estava escrevendo; o
problema era falar diante da classe! Mais uma vez fui salvo por uma letra,
desta vez a “p”. Ele contou tão mal a sua história que pensei ser incapaz de
fazer algo pior. Motivado pelo amigo ao lado, coragem reunida e com certa
desconfiança, lá fui eu contar minha história. Praticamente a história contei
de trás pra frente, me enrolei todo! – “Putz,
ninguém vai entender!” Mas o sorriso que ganhei da Ella ao voltar para o
meu lugar, valeu o sacrifício.
– “Acho que pintou um clima no ar”, que foi logo confirmado no
intervalo quando sentado em um banco Ella se aproximou e sentou ao meu lado.
Havia se identificado com minha história, talvez associando seu pequeno drama
de ter um ex talvez futuro amor que morava em São Paulo. Conversamos um pouco e
ao voltar pra sala, Ella sentou-se bem ao meu lado e seguimos cochichando sobre
relações à distância. Talvez eu estivesse me achando um pouquinho, mas por
vezes confundimos simpatia com picardia e logo me pus em estado de observação
sem dar muito “mole”.
Final de aula, todos levantaram e começaram a sair. Ella ficou na sala e puxou uma
conversa com a professora. Segui meu caminho pelos corredores com uma rápida
parada no banheiro. Já bem perto dos portões da saída da PUC, escuto uma voz
gritando meu nome: – “Ei amado, aonde
você pensa que vai sem mim?” Soltando um sorriso conquistador! Em seguida
veio o convite. – “Vamos tomar uma caipirinha
no bar Jobi, é ali no Leblon! Temos muito o que conversar!”
:: O Bar
Sabe quando alguém se sente em
casa? Foi essa a nítida impressão que tive ao ver Ella entrando naquele bar
lotado, driblando a multidão, indo falar com o garçom, que a conhecia pelo
nome, à procura de uma mesa livre, algo que parecia impossível! O Jobi estava
simplesmente lotado em uma terça-feira qualquer, mas para minha surpresa e
talvez sorte uma mesa disponível aparecera do nada e lá sentamos à espera de
nossas caipirinhas de maracujá.
:: Papo de boteco
Ella estava animada com o que
lera no meu blog, mas ali senti que estava mais pra conselheiro amoroso, do que
para pretendente amoroso.
Um dos segredos para se
conquistar uma mulher é escutar, elas adoram falar sobre suas vidas e seus
antigos amores, e se você prestar atenção de verdade, acaba marcando alguns
pontos, além de receber dicas do que NÃO fazer, já que o teor das conversas são
sempre reclamações.
Mais vale um maracujá na mão do
que um em São Paulo, certo? Minhas chances aumentavam a cada sorriso que
conquistava de Ella, enquanto brincava, melhor dizendo, BRIGAVA tentando tomar
a tal caipirinha com canudinho. Algo IMPOSSÍVEL!, pois o canudinho sempre
entupia com as sementes. – “Fazer uma
mulher sorrir é outro bom caminho para conquistá-la!” Algumas caipirinhas
depois, o papo já não era mais, ou quase não era mais, sobre o carinha de São
Paulo, enfim trocávamos olhares, sorrisos e falávamos de nós mesmos. Excelente
hora para fazer uma proposta, para Ella no caso uma surpresa.
:: A Proposta
– “Quer amanhecer comigo? Adoraria ver o sol nascer com você!”.
Sim... Caminhamos pela praia até
Ipanema. Uma pequena parada lá pelas quatro da manhã no bar “Empório” e claro
mais caipirinhas! Quem convida uma vez, convida duas, certo? – “Quer conhecer o Buraco?”
Eu já esperava um não como
resposta, mas quando dei por mim, estávamos na frente do computador mostrando
as músicas que marcaram nossas vidas no You Tube. Cada vez mais íntimos,
toques, abraços e olhares entre uma música e outra, e aquele momento perfeito
parecia chegar. Aquela música romântica no ar parecia ser A música perfeita,
então você diz pra si mesmo, - “É Agora!”.
Lentamente fui aproximando minha
boca de sua face, mas sem chegar a tocá-la, andei 90% do caminho esperando que
Ella andasse os outro 10%, então aquela frase internacional jogou um balde de água
fria nas minhas expectativas: – “O que
está tentando fazer? Somos amigos!” . Com carinha de cachorro abandonado,
respondi – “Ops! Desculpe, acho que
entrei na esquina errada, por isso “só” cheguei bem pertinho. A culpa é da
caipirinha de maracujá, eu fico meio doce quando tomo tantas, só não vamos
fazer disso climão. Tá?”. Algumas músicas depois, o sol já raiava nas paredes
do Buraco, Ella e eu estávamos à espera de um táxi que a levaria pra casa.
Beijinho, beijinho, tchau, tchau! –
“Xiiii, acho que mandei mal”!
:: Taxi 2 – A Missão
Tudo bem, eu gosto de filmes e o
curso de roteiro é interessante, pode ser o caminho! Ao mesmo tempo acho que
consigo conciliar com o blog, talvez não consiga assistir tantos filmes por
semana... Com aquelas duas não posso contar, Carol só pensa em trabalho e
Nicole só pensa em procurar uma casa nova, mas quem manda? Mal conheceu o
carinha e já foi morar com ele. Eu disse que era prematuro! Você não vai
desistir do curso por causa d’Ella? Vai? – “Anda
Ricardo, levanta esse braço e faz sinal para o táxi!”
:: O Dia
seguinte
Sensação estranha, não tinha
percebido a quantidade enorme de degraus da escada que levava aos longos
corredores, quase intermináveis, parecia que nunca chegaria à sala. Um
olhadinha pelo vidro da porta e notei que Ella não havia chegado, o que
tranquilizou minha entrada. Logo sentei no meu lugar habitual, abri a mochila,
tirei meu caderno e caneta e ao levantar cabeça Ella chegou! Olhou pra mim com
aquele sorriso encantador, em seguida veio a melhor frase do dia – “que bom te ver”.
Minha angústia logo virou
empolgação quando sem a menor cerimônia Ella arrastou uma cadeira e sentou-se
ao meu lado. Aquele silêncio questionador incomodou durante todo o primeiro
período de aula. No intervalo estava sentado em meu banquinho habitual, olhando
para Ella, que conversava com outros alunos a minha frente. Subitamente ela
virou, olhou em meus olhos e veio em minha direção. – “Amado, você estava certo, esse negócio de amor à distância não
funciona comigo, eu sou muito sexual, se é que você me entende. Nós terminamos!”
Quase entalei com o pão de queijo nesta hora, mas meu dever como amigo era
de confortá-la, afinal abrir mão de uma paixão por mais surreal que seja,
afinal só tinham se encontrado uma única vez, deve ter mexido com ela de alguma
maneira. Tem razões que nós homens jamais entenderemos em uma mulher, então
abra um sorriso solidário, deve funcionar bem! Escutar, apoiar e tentar fazê-la
sentir-se melhor era o correto a ser feito. Então Ella disse:
– “Não vá embora hoje sem mim, quero conversar com você”.
:: Proposta 2 – A Missão
A caminhada ao final da aula, da
PUC ao Leblon, foi intercalada com papos do cotidiano e momentos de silêncio. Quando
uma mulher te chama para sair e fica calada, por vezes pensativa, só a sua
presença basta, a sua companhia é tudo o que ela quer. Forçar um papo e você
acaba virando o chato! Mulheres são contraditórias por natureza. A esticadinha
após a aula estava fora de questão, passara a noite anterior no Skype com
Nicole ouvindo os desabafos de uma vida cheia de incertezas.
– “Você realmente faz todas aquelas receitas que tem no seu blog?” Ella
perguntou ao chegarmos na frente da sua casa, e sem perder tempo já emendei com
meu terceiro convite.
– “Um jantar no meu Buraco, e te mostro meu talento culinário, topas?”
:: As Amigas
Os amigos servem pra que? No meu
caso, só pra me deixar mais confuso. Meus planos de fazer um jantar romântico
foram completamente detonados!
CAROLINA: Sempre muito séria e
desconfiada eu não podia esperar outra coisa dela, achava minha ideia fora de
moda, cafona, exagerada, ultrapassada e muitas outras coisas que tagarelou que nem
lembro mais. Segundo Carol: – “Ella vai
sair correndo logo que entrar pela porta. Leva ela pra jantar fora, muito mais
prático”.
NICOLE: Parecia estar mais
interessa na ficha técnica do meu encontro. Por alguns minutos escutei ela
questionar quem era a “perua”? Qual a idade? No que trabalhava? Estado civil? Filhos?
Altura? Dentes? Olhos? Tamanho do pé? Natural ou silicone? entre tantas outras coisas.
Se não tem remédio, remediado está, então só restava me convencer a esquecer o
lado romântico e partir pra algo mais casual e rápido. – “Não dá muito mole, mulher não gosta de homem facinho demais, perde
logo a graça, tem que mostrar interesse, mas parecer desinteressado”.
Bem, com essa explicação nada
lógica e sem o apoio das minhas amigas, só podia contar com meus instintos
pré-históricos, antiquados e fazer meu jantar romântico, trair minha essência,
jamais! Se Ella gostar de mim, tem que ser do jeito que sou, se adequar a
modismos ou modernidades, não era a minha cara, afinal eu sou aquele amante a
moda antiga, do tipo que ainda manda flores.
:: O Dia D
Hum... No cardápio, rondelli com
salmão e uma salada para acompanhar. Rápido, fácil e gostoso. Um vinho tinto
para dar um brilho nos olhos e uma seleção especial de músicas como fundo.
Claro tudo isso temperado com luz de velas para um dar um clima íntimo, pétalas
de rosas espalhadas pela chão ao redor da mesa e um incenso suave pelo ar! O
detalhe final, ligar meu notebook na televisão e colocar um vídeo com a imagem
de uma lareira com direito ao barulhinho da madeira estalando ao fundo. Nem é
tão romântico assim! É?
– “Então corre Ricardo, sai logo dessa cama, tem muito a ser feito, o dia
é curto e a noite, se tudo der certo, vai ser longa!”
:: O Jantar
A campainha da porta toca
precisamente às nove horas, Ella chegou! Uma mulher chegando pontualmente, tem
alguma coisa errada aí! – “Anda Ricardo
abre logo a porta!”
O mesmo sorriso encantador, quase
uma marca registrada, seguido de um abraço bem apertado. – “Nossa, tudo isso pra mim?”. Mas o brilho nos olhos me deu a
certeza que fiz a coisa certa, Ella estava encantada. Sentamos no sofá, meu
amigo MC Ipig! precisamente iniciou a seleção de músicas, que logo foi regada
com duas taças de vinho e um brinde. – “Que
essa noite seja encantadora como você”. Uau! Quem não gostaria de ouvir um
brinde destes? Na terceira música me levantei e fui para cozinha, coloquei meu
avental e dei início aos preparativos pro jantar. Velas na mesa acesas, mais um
pouco de vinho nas taças e o jantar estava servido. Ella estava linda, com um
vestido tomara que caia, pouca maquiagem, um brilho nos lábios e o melhor, só
falávamos de nós dois, de nossos planos de vida, sonhos e desejos, só faltava a
lua! – “Como não pensei nisso?”. De
volta ao sofá, sentamos bem pertinho um do outro. Sabe aquele momento que
combina com aquela música romântica que se espalhava pelo ar, então você diz
pra si mesmo, “é agora!”. Estávamos
lá, dançando coladinho, embalados pelo romance no ar, olhei bem nos olhos dela
por alguns segundos e fui aproximando meus lábios, só até 90% do caminho,
claro! Um sorriso discreto no rosto e lá vem ela, enfim os 10% estavam a
caminho. Eu disse estavam! Porque lá pelos 5% minha vizinha show de bola
resolve mostrar seus dotes sexuais, demonstrando seu imenso prazer aos berros
que ecoavam pelas paredes do Buraco, interrompendo nossa dança e quebrando totalmente
o clima. Caminhei até a janela e a fechei, pedi desculpas pelo show da vizinha
e totalmente sem jeito fui andando na direção do sofá. – “O que você está fazendo, volta pra cá, adoro essa música, vem dançar
comigo!”. Isso sim que é amigo, MC Ipig! mandou bem, colocando outra música
e lá estávamos nós dois dançando coladinho novamente. No meu melhor estilo Fred
Astaire, dois passinhos pra lá, dois passinhos pra cá, dois rodopios e Ella
estava em meus braços e nada de andar 90% desta vez! Suavemente me inclinei
sobre seu corpo e a beijei, voltando em seguida a dançar no ritmo da música. O
final da música estava se aproximando, aquilo merecia um Grand Finale! Minha
mão percorreu a trilha aberta pelo decote em suas costas chegando até sua nuca,
delicadamente virei seu rosto e lentamente fui me aproximando de sua boca, quando
toca a campainha.
:: Mui Amiga
Nem precisa falar, minha noite
tinha acabado naquela hora! Na porta estava Carol aos prantos, pedindo mil
desculpas por estar ali e dizendo que fui a primeira pessoa em quem ela pensou,
tinha sofrido um acidente de carro, nada sério, não tinha nenhum arranhãozinho,
mas estava emocionalmente perturbada. Em poucos segundos estava consolando-a no
sofá, tentando acalmá-la, dizendo que estava tudo bem, que havia sido só um
susto. Ella veio da cozinha com um copo de água com açúcar, Carol agradeceu,
olhou pra Ella e em seguida pra mim, então veio a frase que sepultaria minha
noite – “Eu posso dormir aqui? Não quero
ir pra casa!”. Nem deu tempo de responder, Ella pegou sua bolsa e disse que
era melhor ir embora, que no outro dia a gente se falava no curso e foi caminhando em
direção à porta. Meus apelos foram em vão, e nem podia jogar Carol pela janela,
moro no segundo andar, no máximo uns arranhões! Os dois beijinhos no rosto que
levei de Ella na porta de casa só não foram pior que a frase que veio em
seguida. – “Acho melhor você cuidar da
sua amiga, eu te ligo, QUEM sabe marcarmos um outro dia”.
:: Quem disse que não piora?
Bem, só me restava consolar minha
mui amiga Carol que aparentemente estava mais calma. Sentei no sofá olhei bem
dentro dos olhos de Carol e perguntei se estava mais calma. Um abraço forte
seguido de um obrigado foi sua resposta. Toca a campainha, Carol de olhos
arregalados me assiste caminhar em direção à porta e abrí-la. Carol pergunta – “Ella voltou?” e a resposta não
demorou muito – “Posso passar uns dias
aqui com você? Tivemos uma briga horrível e não tenho outro lugar pra ir!” Com
uma cara de tô nem aí e com as mão cheias de malas, Nicole parecia estar de
mudança para o Buraco sem aviso prévio! – “Aquela
no corredor era a talzinha? Gostosa ela, viu! Sobrou jantar? Tô com fome!”
:: FIM
Próximo episódio - Cinco dias com Nicole
Episódio 2 - O Jantar Romântico
Reviewed by Unknown
on
3:10 PM
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